A síndrome vestibular bilateral ou arreflexia vestibular bilateral ou hipofunção vestibular bilateral é a perda total ou parcial da função de equilíbrio das duas orelhas simultaneamente, mais comumente causada por medicação ou infecção. Não é um quadro raro, mas é diferente das outras labirintopatias porque não causa sintomas intensos e súbitos, e sim leves, mas persistentes e crônicos. Neste post, falarei sobre os sintomas, causas, diagnóstico e tratamento desta condição.
CAUSAS
A causa mais comum é a ototoxicidade, que é o efeito de um medicamento ou agente infeccioso (vírus ou bactéria ou fungo) de reduzir a função do ouvido interno, tanto audição quanto a função labiríntica. A gentamicina, um antibiótico usado em infecções urinárias, sepse, infecções do trato biliar, gastroenterites, pneumonia, infecções uterinas e peritonites, é o medicamento classicamente relacionado a esse efeito, e inclusive é usado como tratamento em alguns casos na doença de Meniere (veja post específico- colocar link).
Outras possíveis causas são: sífilis, traumas de osso temporal, traumatismo craniano intenso, meningite, labirintites infecciosas, tumores (neurofibromatose tipo II), otosclerose, hidropsia endolinfática (doença de Meniere), cirurgias nas duas orelhas, doenças auto-imunes, genéticas e idiopáticas (quando foi investigado, mas não revelou nenhuma doença).
SINTOMAS
A oscilopsia e o desequilíbrio são as queixas mais comuns.
A oscilopsia é a sensação de oscilação do campo visual, principalmente na movimentação da cabeça ou quando andamos. Em outras palavras, quando o paciente mexe a cabeça, tem a sensação de que os objetos estão se movendo, ou ficam borrados, ou que a visão piora quando ele está em movimento. Paciente reclama que não tolera movimentos da cabeça. Esse sintoma é causado por perda do reflexo vestíbulo-ocular.
Já o desequilíbrio é decorrente da perda do reflexo vestíbulo-espinhal, e piora quando o paciente está no escuro (acorda de madrugada para ir ao banheiro) e sobre superfícies irregulares (ex areia, grama).
Nos quadros agudos, o paciente também apresenta sintomas neurovegetativos (sudorese, náusea, taquicardia, vômitos), alteração da forma de andar , com descoordenação dos movimentos e instabilidade mais intensa.
A síndrome vestibular bilateral idiopática tem essencialmente 3 apresentações clínicas: episódios repetitivos de breve oscilopsia, crises recorrentes de vertigem e instabilidade progressiva com oscilopsia.
DIAGNÓSTICO
Além das queixas típicas, o exame físico fornece pistas diagnósticas importantes. O teste de head-thrust ou impulso da cabeça é positivo bilateralmente, mostrando sacadas de recuperação depois de movimentos bruscos da cabeça.
Figura 1- head thrust . Extraído de https://vertigodifferentiation.weebly.com/head-thrust.html
O teste dos olhos de boneca ou pesquisa do reflexo oculocefálico (paciente é solicitado a fixar os olhos no nariz do médico enquanto realiza rotações lentas da cabeça) também é positivo, mostrando movimentos oculares compensatórios fragmentados ou sacádicos.
FIgura 2- teste dos olhos de boneca ou reflexo oculocefálico.
O diagnóstico é confirmado na vectoeletronistagmografia (testes calóricos e rotacionais), v-HIT e/ou VEMP. Esses exames mostram a ausência ou diminuição acentuada da função do labirinto de ambos os lados.
Outros exames, como os de imagem ou de sangue, podem ser solicitados para investigar a causa da doença, se a história clínica não for suficiente.
TRATAMENTO
A reabilitação vestibular é o melhor tratamento, baseada na substituição das funções vestibulares por informações visuais e proprioceptivas, além de promover a compensação central. Nesses casos, a terapia é prolongada. Jovens e pacientes com função labiríntica residual têm resposta mais rápida.
Uma alternativa ainda em desenvolvimento é o implante vestibular, com implantação cirúrgica de um sensor vestibular, mas ainda não está disponível.
Medicamentos supressores vestibulares não são usados, pois, além de não reduzirem o desconforto do paciente, atrapalham a compensação labiríntica.
Muito importante avisar ao paciente sobre atividades que NÃO devem realizar, pois se exporia a um grande risco, a saber, atividades em altura de maneira geral (ficar em pé a beira de precipícios ou de plataformas de trens) não praticar mergulho e muito cuidado em praia ou piscinas (não nadar e ficar no raso).
Esses pacientes são virtualmente imunes a cinetose.
Dra Kênia Assis Chaves
Médica Otorrinolaringologista
CRMMG 52018
RQE 33072